O setor de turismo e lazer é a indústria da experiência, onde a memória feliz do cliente é o produto final. No entanto, o palco dessa alegria é frequentemente montado sobre uma complexa e por vezes desumana dicotomia: a linha tênue entre a exaustão do colaborador e o descaso das empresas para com o seu bem-estar. A promessa de descanso e entretenimento para o consumidor é, paradoxalmente, a negação do ócio digno para o profissional que a executa.
A experiência do cliente é invariavelmente construída sobre o sacrifício do tempo e da energia do colaborador. Enquanto o turista desfruta de feriados, fins de semana e da flexibilidade do mundo atual, o profissional da área opera em regime de alta demanda e pouca pausa. Essa dinâmica é cruelmente evidenciada nas escalas de trabalho, como a 6x1, que se tornou a norma do setor. Este regime comprime o tempo de repouso semanal, transformando a única folga em uma obrigação logística. Embora a escala 5x2 seja a ideal para o equilíbrio entre vida pessoal e trabalho, o ritmo frenético do turismo e a busca incessante por margens de lucro raramente a comportam.
Nesse cenário de pressão operacional, surge o descaso das empresas como um argumento central. Ao ignorar o impacto cumulativo da fadiga, algumas organizações veem a legislação trabalhista não como um guia para o bem-estar, mas como um limite a ser contornado. O Artigo 136 da CLT, que trata do direito a férias, é um exemplo. Embora garanta o descanso anual remunerado, seu parágrafo único, que permite ao empregador vetar o período escolhido por "necessidade imperiosa", é frequentemente utilizado para postergar o merecido repouso do trabalhador, reforçando a ideia de que o negócio está sempre acima da saúde do indivíduo.
Argumenta-se que a paixão pelo serviço e a satisfação em proporcionar alegria são recompensas inerentes, e que a rotatividade de horários é intrínseca à atividade. Contudo, essa contra-argumentação idealizada camufla o risco real: o perigo de não ter uma folga mental genuína e completa do trabalho. A "dor" daquele que trabalha no cuidado e no lazer é a de ter que sustentar o sorriso e a empatia mesmo em exaustão, levando ao burnout e à precarização da saúde mental. Um colaborador esgotado, que sente o descaso da empresa, não oferece hospitalidade genuína; ele apenas a simula.
Portanto, o futuro para essa discussão sobre a linha tênue entre descanso e trabalho é urgente e exige uma redefinição de valores. Não se trata de paralisar a indústria, mas de torná-la sustentável a longo prazo. O caminho passa pela incorporação de tecnologias que aliviem a carga manual, por uma gestão de escala que privilegie o direito ao descanso e por uma cultura corporativa que reconheça que o bem-estar do profissional é o principal ativo da hospitalidade. O verdadeiro futuro do turismo e lazer é aquele em que a felicidade do cliente não seja mais construída sobre a exaustão silenciada do colaborador.
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